OS QUERUBINS

ÊX 25.18-22

 

Pr. José Antônio Corrêa

 

INTRODUÇÃO:

 

Vimos no estudo anterior o simbolismo que envolvia os utensílios no interior da Arca – as tábuas da lei, o pote do maná e a vara de Arão que floresceu. As tábuas da lei têm a ver com a Palavra e a Revelação de Deus ao seu povo através dos tempos. Significa Deus dando ao homem mandamentos e preceitos que se obedecidos trarão bênçãos e prosperidade; o pote do maná, simboliza o suprimento material e espiritual que recebemos de Deus para vivermos dignamente neste mundo. Jesus é o Pão que desceu do céu; a vara de Arão tem a ver com a demonstração do poder de Deus, que pode dar vida mesmo em face da morte! Jesus é a Ressurreição e a Vida! Isto ficou demonstrado através de Seu poder nas ressurreições ocorridas durante a sua caminhada terrena – a filha de Jairo, chefe da sinagoga; o filho da viúva de Naim; e a ressurreição de Lázaro, já morto há quatro dias. Porém a maior demonstração do poder de Jesus sobre a morte foi a sua própria ressurreição, quando Ele venceu a morte. No presente estudo queremos falar sobre os Querubins, que eram um tipo de ornamento sobre a tampa da Arca – o Propiciatório. Queremos ver a sua descrição e seus simbolismos.

 

I. OS QUERUBINS

 

1. Pela instrução divina, os querubins (bwrk - keruwb) deveriam ser construídos de ouro batido nas duas extremidades do Propiciatório. Seriam construídos de uma só peça fundida, juntamente com o Propiciatório; suas asas deveriam estar estendidas sobre o Propiciatório e suas faces voltadas um para o outro e consequentemente voltadas também para o Propiciatório. A promessa de Deus é que Ele se manifestaria e falaria ao seu povo entre os querubins. Não é por acaso que as Escrituras nos informam que o Deus Todo-Poderoso está entronizado (habita) entre os querubins: "O Senhor reina, tremam os povos; ele está entronizado sobre os querubins, estremeça a terra", Sl 99.1. Sobre esta particularidade divina nos escreve Shedd:

 

"No propiciatório, onde Deus se mostrava propício e misericordioso, Deus aceitava o representante do povo, o Sumo Sacerdote, quando este se aproximava mediante o sacrifício expiatório, e ali respondia suas perguntas referentes à vontade de Deus para com eles. Visto que esse encontro entre Deus e Seu povo era o objetivo supremo do tabernáculo inteiro, este é chamado de ‘tenda da congregação’ (Êx 27:21)". (1)

 

2. Uma descrição detalhada sobre os querubins nos é fornecida por Cole:

 

"Estes eram, mais provavelmente, esfinges aladas com rostos humanos, a julgar pelas visões de Ezequiel 1 e Apocalipse 4, bem como pelo uso do termo no Egito (embora os querubins sejam mencionados em Gn 3.24, não são descritos). Na Assíria, o karubu (mesma raiz semítica) tem a função de guarda de templo. Em Israel, os querubins simbolizavam os espíritos que ministravam como servos e mensageiros de Deus (Sl 104.3,4) e por isso suas imagens não eram uma violação de 20:4, já que ninguém os adorava. Figuras de querubins, bordadas em cores vivas, eram encontradas por toda a volta da cortina interior do Tabernáculo (36.35), de modo que sua presença sobre a arca não era uma ocorrência isolada. O Templo de Salomão possuía dois enormes querubins de oliveira, cobertos de ouro, de cinco metros de altura, os quais pairavam sobre a arca (2 Cr 3.10). Este é apenas um dos muitos detalhes em que o Templo de Salomão era mais elaborado do que os planos aqui esboçados para o Tabernáculo".(2)

 

3. Pela descrição de Cole, e também pelo que entendemos os querubins serviam apenas como "ornamentos", e nunca como instrumentos para adoração, uma vez que se assim fossem haveria uma contradição bíblica, já que há inúmeras proibições na Palavra de Deus quanto à adoração de imagens de escultura. Em Êx 20.4-5, temos: "4 Não farás para ti imagem esculpida, nem figura alguma do que há em cima no céu, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra. 5 Não te encurvarás diante delas, nem as servirás; porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me odeiam". Observe que não somente é proibida a adoração de imagens, mas também a sua construção, sob o risco da maldição divina que "... visitaria a iniquidade (iniquidade aqui é uma referência à construção ou adoração de ídolos) dos pais nos filhos...", por várias gerações subsequentes. Outro texto que pode ser consultado é Is 42.8, onde o Senhor não admite que a sua glória seja dividida com outros deuses ou com quaisquer imagens de escultura: "Eu sou o Senhor; este é o meu nome; a minha glória, pois, a outrem não a darei, nem o meu louvor às imagens esculpidas".

 

II. SIMBOLISMOS

 

1. O SIMBOLISMO DA UNIDADE

 

1) Olhando para o Propiciatório, observamos que ele era confeccionado a partir de uma única barra de ouro que foi forjada no fogo, "...de ouro batido os fez nas duas extremidades do propiciatório ... de uma só peça com o propiciatório...", vs. 7-8. O trabalho de fundição deveria obedecer a instrução de Deus, que a partir de apenas uma "única" barra de ouro, a peça contendo os dois querubins fosse formada. Isto certamente nos sugere unidade, indivisibilidade, comunhão. Sobre esta construção e disposição dos Querubins, bem como a sua simbologia nos escreve Luciano Subirá:

 

"A unidade ainda traz consigo outras virtudes. Podemos ver isto numa das figuras bíblicas do Tabernáculo. O propiciatório da arca da aliança figura este princípio. O Senhor disse que ali Ele viria para falar com Moisés. O propiciatório (ou tampa da arca) era o lugar onde a glória e a presença de divina se manifestava. E nas instruções para a confecção desta peça, vemos o simbolismo da unidade. Deus disse que os dois querubins deveriam ser uma só peça de ouro batido; com isto falava simbolicamente de unidade entre seus adoradores (Ex.25:17-19)".(3)

 

2) Dentro dos propósitos do Senhor para sua Igreja, como algo de grande importância está a unidade cristã. Orando pelos seus discípulos Jesus pediu ao Pai: "para que todos sejam um; assim como tu, ó Pai, és em mim, e eu em ti, que também eles sejam um em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste", Jo 17.21. Jesus sabia que o inimigo iria semear entre seus seguidores desavenças, contendas, desarmonias, etc. Por esta razão ora ao Pai no sentido de que a influência do inimigo não viesse macular o relacionamento deles.

3. Como Igreja de Cristo devemos lutar para manter a unidade em nosso meio. Encontrarmos nas Escrituras muitas advertências sobre este assunto. Queremos percorrer algumas delas:

a) Jo 17.23, "perfeição na unidade", "eu neles, e tu em mim, para que eles sejam perfeitos em unidade, a fim de que o mundo conheça que tu me enviaste, e que os amaste a eles, assim como me amaste a mim".

b) 1Co 1.10, unidade de pensamento, "Rogo-vos, irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que sejais concordes no falar, e que não haja dissensões entre vós; antes sejais unidos no mesmo pensamento e no mesmo parecer".

b.2) Ef 4.3, unidade do espírito, "procurando diligentemente guardar a unidade do Espírito no vínculo da paz".

b.3) Ef 4.13, unidade da fé, "até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, ao estado de homem feito, à medida da estatura da plenitude de Cristo".

b.4) Cl 2.2, unidade no amor, "para que os seus corações sejam animados, estando unidos em amor, e enriquecidos da plenitude do entendimento para o pleno conhecimento do mistério de Deus-Cristo".

3. Diante de todas estas citações bíblicos, podemos deduzir que a unidade é imprescindível na Igreja de Cristo. Quando há unidade entre nós, há paz, alegria! Podemos afirmar como o salmista: "1 Oh! quão bom e quão suave é que os irmãos vivam em união! 2 É como o óleo precioso sobre a cabeça, que desceu sobre a barba, a barba de Arão, que desceu sobre a gola das suas vestes; 3 como o orvalho de Hermom, que desce sobre os montes de Sião; porque ali o Senhor ordenou a bênção, a vida para sempre", Sl 133.1-3.

 

2. O SIMBOLISMO DA COBERTURA

 

1) Os querubins com suas asas estendidas sobre o Propiciatório é um símbolo de cobertura que não deve ser desprezado por nós. Sobre esta analogia, também podemos ver o comentário de Luciano Subirá:

 

"Os querubins deviam estar com as asas estendidas um para o outro (Ex.25:20), o que fala de cobertura recíproca. A falta de unidade nos leva a agir com o espírito de Caim que disse ao Senhor: "Acaso sou eu guardador de meu irmão?" (Gn.4:9). Mas quando estamos em unidade com alguém, cobrimos e protegemos esta pessoa! Esta é uma virtude que acompanha a unidade".(4)

 

2) O princípio da cobertura é o princípio da proteção ao irmão. Se refere àquele cuidado que devemos demonstrar em relação ao irmão mais fraco, que de certa maneira, depende de nós! A Igreja que não tem um programa de cobertura, de proteção e cuidado aos seus membros, verá muitos deles naufragarem em sua fé, além de ser vítima das seitas anticristãs, que fazem arrastão para "pegar" os menos esclarecidos. O programa de cobertura traz ao crente novo, ao menos experiente, uma grande segurança, pois este irmão saberá a quem recorrer quando for atingido pelas pressões e tribulações deste mundo, muito comuns naqueles que estão dando os primeiros passos, Mt 13.21, "...e sobrevindo a angústia e a perseguição por causa da palavra, logo se escandaliza".

3) O cuidado e proteção ao irmão mais fraco, ao novo na fé, é recomendado de forma clara em todo o Novo Testamento:

a) Devemos aprender a suportá-los, Rm 15.1, "Ora nós, que somos fortes, devemos suportar as fraquezas dos fracos, e não agradar a nós mesmos".

b) Não devemos ser para eles motivo de tropeço, 1Co 8.9, "Mas, vede que essa liberdade vossa não venha a ser motivo de tropeço para os fracos". No dizer de Jesus aquele que fizer tropeçar o irmão mais frágil, receberá duro juízo – Mt 6.18, "Mas qualquer que fizer tropeçar um destes pequeninos que creem em mim, melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço uma pedra de moinho, e se submergisse na profundeza do mar".

c) Precisamos descer ao nível deles, para poder ajudá-los, 1Co 9.22, "Fiz-me como fraco para os fracos, para ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos, para por todos os meios chegar a salvar alguns".

d) Devemos lembrar que os fracos também são necessários no corpo de cristo, 1Co 12.22, "Antes, os membros do corpo que parecem ser mais fracos são necessários".

e) Precisamos ampará-los com longanimidade, 1Ts 5.14, "Exortamo-vos também, irmãos, a que admoesteis os insubordinados, consoleis os desanimados, ampareis os fracos e sejais longânimos para com todos".

4) Certamente, se como Igreja de Cristo, elaborarmos um programa que dê cobertura, que proteja os mais fracos, os menos experientes, os novos, só teremos a ganhar, pois os veremos crescer na fé e na graça do Senhor.

 

3. O SIMBOLISMO DA TRANSPARÊNCIA

 

1) Devemos lembrar que os Querubins ao serem construídos, o foram numa disposição que os colocavam frente-a-frente. Podemos dizer que um estava olhando no olho do outro. Como analogia, devemos aplicar este princípio a nós que cremos no mesmo Deus, e desfrutamos de uma mesma fé cristã. Não podemos adiar nossos desentendimentos, nossas pendências, sob o risco de espalhamos a "raiz de amargura", e "cairmos na graça de Deus", "... tendo cuidado de que ninguém se prive da graça de Deus, e de que nenhuma raiz de amargura, brotando, vos perturbe, e por ela muitos se contaminem", Hb 12.15. Observe o comentário de Luciano Subirá:

 

"A outra, é a transparência. Os querubins deveriam estar um de frente para o outro (Ex.25:20). Isto fala alegoricamente de poder encarar outro adorador "olho no olho". Fala de não ter nada escondido, de não ter pendências. Ninguém consegue olhar (espontaneamente) no olho de outra pessoa quando as coisas não estão bem. Quando Jacó fala para sua família que as coisas já não estavam bem entre ele e Labão, seu sogro, a expressão que ele usa é: "vejo que o semblante de vosso pai já não é mais o mesmo para comigo" (Gn.31:5). Jesus disse que os olhos são a candeia do corpo. Eles refletem o que está dentro de nós. E a unidade é a capacidade de olhar olho no olho e estar bem. Particularmente, eu não posso concordar com casais que escondem coisas um do outro, seja no que diz respeito à sua vida passada (erros e pecados) ou presente (como nas questões financeiras, por exemplo)".

Acredito que a unidade verdadeira exige que haja remoção ou acerto de "pendências" (Pv.28:13). Às vezes fingimos um comportamento só para agradar (ou não desagradar) ao outro, o que diverge do ensino bíblico. Este teatro não produzirá unidade verdadeira. Temos que aprender a ser francos, como está escrito: "Melhor é a repreensão franca do que o amor encoberto" (Pv.27:5). Paulo censurou este tipo de comportamento dúbio quando escreveu aos gálatas. Ele falou sobre como o apóstolo Pedro em certa ocasião agiu assim para ser "diplomático" e que esta atitude conseguiu atrair até mesmo o próprio Barnabé, companheiro de Paulo, e ele os censurou publicamente (Gl.2:11-14). Contudo, quero ressaltar que ser franco não significa ser grosseiro, pois a Bíblia nos ensina a falar a verdade em amor. O conselho dado a Timóteo na hora de corrigir os que opunham, foi o de usar de mansidão (2 Tm.2:25). A unidade manifesta a verdade (dolorosa às vezes) de forma bem mansa".(5)

 

2) O princípio da transparência, é um princípio não menos importante do que os anteriores, embora não seja não muito usado em nosso meio. Muitos filhos de Deus, ao invés de utilizarem a confrontação em amor, agem às escondidas, na penumbra, atitudes que os assemelham aos filhos das trevas. Ao invés de ficarmos resmungando às escondidas, por detrás das portas, falando mal daquele irmão - fruto de nosso desentendimento, devemos agir como verdadeiros filhos de Deus, reabrindo o diálogo, confrontando e resolvendo as pendências.

3) Este princípio da transparência, é o princípio que corrige nossas relações erradas, nossa maneira de encarar o irmão. Não podemos dizer que tudo está bem, se há algo que frustre a minha vida comum com meu irmão em Cristo. Não posso entender como muitos que se dizem filhos de Deus conseguem viver por longos anos cultivando mágoas, ódios, ressentimos, etc., contra irmãos de fé. Não podemos nos esquecer que o Senhor, não somente ordenou que amássemos nossos irmãos, como também nossos próprios inimigos, Mt 5.44, "Eu, porém, vos digo: Amai aos vossos inimigos, e orai pelos que vos perseguem". Paulo aconselha a praticarmos o bem àqueles que nos odeiam e nos perseguem, Rm 12.20, "Antes, se o teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer; se tiver sede, dá-lhe de beber; porque, fazendo isto amontoarás brasas de fogo sobre a sua cabeça". Ora, se devemos tratar assim nossos inimigos, quanto mais nossos irmãos em Cristo?

4) Há necessidade de transparência em nosso relacionamento cristão! Quando nos desentendemos como outro irmão devemos procurá-lo para os devidos acertos, restaurando assim a comunhão entre nós e com o Senhor. Não cabe em minha mente achar que crentes que se relacionam mal com outros crentes possam desfrutar de um bom relacionamento com Deus. Pelo contrário, veja como o Senhor nos orienta: "23 Portanto, se estiveres apresentando a tua oferta no altar, e aí te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, 24 deixa ali diante do altar a tua oferta, e vai conciliar-te primeiro com teu irmão, e depois vem apresentar a tua oferta", Mt 5.23-24. Nossa oferta não será aceita, até que a pendência não for resolvida!

5) Para que uma pendência entres irmãos possa ser resolvida, devidamente tratada, também há necessidade de que as partes estejam dispostas a exercitar o perdão, caso contrário dificilmente haverá os acertos necessários. É isso que nos mostra Jesus: "Tende cuidado de vós mesmos; se teu irmão pecar, repreende-o; e se ele se arrepender, perdoa-lhe", Lc 17.3. Veja ainda a passagem paralela de Mateus: "Ora, se teu irmão pecar, vai, e repreende-o entre ti e ele só; se te ouvir, terás ganho teu irmão", Mt 18.15. Em Lucas temos a expressão: "... se ele se arrepender, perdoa-lhe"; em Mateus: ".. se te ouvir, terás ganho teu irmão. Tanto uma expressão, como outra nos falam de reconciliação, de acerto!

6) Vamos aprender a lidar com as dificuldades de relacionamento, procurando fazer os acertos necessários, para vivermos uma vida em Deus abundante, vitoriosa!

 

BIBLIOGRAFIA:

 

BÍBLIA ONLINE. Sociedade Bíblica do Brasil. Versão 2.01. 1999.

COLE, Alan, Ph.D. Êxodo, Introdução e Comentário. Sociedade Religiosa Edições Vida Nova. São Paulo, 1963.

SHEED, Russel. O Novo Comentário da Bíblia. Edições Vida Nova. São Paulo. Vol. I, págs.143-154.

SHEED, Russel. O Novo Dicionário da Bíblia. Edições Vida Nova. São Paulo. Vol. III, págs. 1553-1557.

SUBIRÁ, Luciano. Artigo "A Unidade Entre o Casal". Site: www.manaedicoes.com.br.

 

NOTAS:

 

(1) SHEED, Russel. O Novo Comentário da Bíblia. Edições Vida Nova. São Paulo. Vol. I, pág. 144.

(2) COLE, Alan, Ph.D. Êxodo, Introdução e Comentário. Sociedade Religiosa Edições Vida Nova. São Paulo, 1963. Pág. 185.

(3) SUBIRÁ, Luciano. Artigo "A Unidade Entre o Casal". Site: www.manaedicoes.com.br.

(4) Id. Ibid.

(5) Id. Ibid.