O Sobrevivente
Por José Nunes Dias
Pr. José Antônio Corrêa
"Meu
nome é José Nunes Dias, sou jornalista, do Espírito Santo. Quando eu fiz 16
anos, fui a uma festa de família, bebi um gole de cerveja e virei um
alcoólatra. Quando eu tinha 17 anos, além do álcool comecei a usar bolinhas,
aos 18 eu já consumia álcool, bolinha e maconha. A partir daí não parei mais.
Durante 26 anos rastejei no lamaçal da droga. Nos dez anos seguintes,
aprisionado nas drogas, eu acumulava derrotas e sofrimento - perdas materiais e
financeiras, acidentes de carro, detenções, espancamentos, tentativas de
suicídio. Mesmo assim, consegui ingressar no jornalismo, casei em 1976, um ano
depois nasceu Katyúscia, minha primeira filha.
Apesar
de tudo, em 1979 eu estava até bem profissionalmente. Era o chefe de reportagem
do jornal A Gazeta, o maior do Espírito Santo, Estado onde nasci, me criei e
vivo até hoje. Era ainda repórter especial da maior tevê regional, morava num
apartamento à beira-mar, tinha carro novo na porta, toda a comodidade dentro de
casa e um inferno profundo no coração. Levei as drogas pra dentro do meu
casamento...
O
meu apartamento era freqüentado por traficantes, ladrões, assassinos,
prostitutas, homossexuais. Eu e minha mulher nos torturávamos física e
moralmente todos os dias e todas as noites. Nosso casamento naufragou no
lamaçal do adultério e da prostituição. No início de 1980 nos separamos e
tentei morrer cortando meus próprios pulsos . Não morri, mas perdi tudo. Pedi
demissão em meus empregos, peguei o dinheiro da indenização e gastei tudo em
drogas. Durante seis meses não fiz outra coisa na vida a não ser me drogar. Eu
não tomava banho, não mudava a roupa, não cortava o cabelo, não fazia a barba.
Não almoçava, não jantava, não dormia. Eu só queria usar drogas. Depois de seis
meses eu já não tinha nada. Nem casa, nem família, nem amigos, nem dinheiro.
Perambulava pelas madrugadas, de bar em bar, de mesa em mesa, pedindo esmolas a
estranhos para juntar os trocados e comprar drogas. Eu virei um mendigo...
Um
dia tive um restinho de lucidez e percebi que precisava de ajuda. Pedi socorro
a meus pais. Eles foram à Federação Espírita, que me sugeriu uma clínica de
recuperação. Lá, fiquei diante de um portão enorme, parecendo de penitenciária,
abriram aquele portão e me trancafiaram. Aos 28 anos, por causa do meu uso
abusivo de drogas, cheguei aos limites do sofrimento humano. Estava internado
num hospício. E aquele hospício era um local de tortura e de morte. Ali haviam
solitária, choque elétrico, morte. Eu vi gente morrendo ali dentro. Tinha
psicopata assassino junto com a gente. Quase perdi a vida naquele lugar, só
consegui escapar vivo graças à misericórdia de Deus. Saí daquele hospício
disposto a me regenerar. Reconciliei-me com a mãe de minha filha, prometi não
mais usar drogas, saímos daquele apartamento na praia e fomos morar numa
favela.
Em
85 eu já reconquistara meu espaço social e profissional, havia nascido Mariana,
minha segunda filha. Eu achava que estava muito bem na vida. Tanto que todo
domingo tinha churrasco, pagode e cerveja na minha casa. Minha casa ficava
cheia de amigos. Estava tudo aparentemente tão bem que um dia resolvi tomar um
gole de cerveja. Seis meses depois havia perdido tudo de novo e estava afundado
nas drogas. Eu não tinha mais apartamento, nem mulher, nem filhas, nem carro,
nem pagode, churrasco e muito menos amigos... Estava outra vez na sarjeta.
Resolvi me suicidar com tranqüilizantes. Eu comprei 15 caixas, 300 comprimidos.
Cheguei ao CTI de um hospital da cidade com 215 tranqüilizantes no organismo,
pneumonia e em coma profundo. Num estado desesperador. Tive uma experiência
sobrenatural no coma, achei que era um aviso de Deus e resolvi que, quando
saísse do hospital, procuraria uma religião. Cumpri a palavra: quando saí,
transformei-me em médium numa seita espírita onde fiquei durante três anos e
meio. Nunca perdi tanto em minha vida. Meu casamento caiu de vez num
angustiante pesadelo. Minha única vitória foi ficar num porre seco, sem usar
drogas. Mas no restante a minha vida virou um inferno. No início de 90, eu
estava completamente falido. Desempregado, sem dinheiro, desiludido, com o
casamento aos pedaços. Sem qualquer esperança.
Com
a ajuda de Jesus, consegui ver minha situação revertida e poucas semanas depois
conquistava algumas vitórias. Mas em dois anos eu descuidei do meu lado
espiritual e fali . No início de 93 me perdi totalmente. Numa hora estava
sóbrio, na outra ficava me drogando. Em alguns momentos era uma pessoa normal,
depois mergulhava num poço de insanidade. No início de 94, apesar de uma vida
profissional satisfatória, eu era um homem completamente perdido, atordoado,
desesperado. No segundo semestre de 94, meu casamento que nunca foi bom, estava
totalmente destruído. Abandonei minha família, envolvi-me numa relação
extraconjugal e fui morar num apart-hotel. Dias depois estava absolutamente só
e o que eu queria mesmo era morrer, drogando-me. E durante 90 dias me droguei
pesadamente. Não fiz nada na vida a não ser me drogar. Eu não atendia a porta,
não abria a correspondência, não atendia o telefone. Não cortava o cabelo, não
fazia a barba, não trocava de roupa, não tomava banho. Não comia, não dormia.
Eu só usava drogas. Só ia à rua escondido, que nem um bandido, pra comprar
drogas.
E
numa noite daquelas, entrei numa confusão de bar e fui levado para uma
delegacia de polícia. Lá, o delegado de plantão e quatro investigadores me
torturaram a noite inteira. Eles me espancaram muito, violentamente. Estavam
possessos, de nada adiantaram todas as minhas credenciais, ou minhas carteiras
de jornalista ou de identidade. Eles queriam me matar. Num determinado momento
o delegado colocou o cano da pistola na minha boca e por pouco não me
assassinou. De manhã me libertaram. Totalmente destruído, física, moral e espiritualmente.
Tranquei-me no apartamento para morrer de uma vez. Dias depois, no anoitecer de
22 de dezembro de 1994, eu estava naquele apartamento, sozinho, perto de uma
overdose e pronto para encontrar a morte. Eu já não agüentava nem andar. Tinha
me transformado num verme, rastejava de um canto para outro atrás de droga,
espalhada por cada canto naquele apartamento. Mesmo assim, naquela noite eu
ainda tomei várias doses de álcool doméstico - aquele perfumado que a gente usa
pra desinfetar banheiro. Eu ia morrer.
Mas
naquela noite tive uma experiência concreta e definitiva com Deus, fiz uma
aliança com Ele e 24 horas depois estava no apartamento de minha mãe, que
chorava muito. Vinte e seis anos depois daquele primeiro gole de cerveja, um
farrapo humano e uma trágica história. Três acidentes de carro, três tentativas
de suicídio, duas de assassinato, dois espancamentos, quatro detenções com
agressões e humilhações, seis separações da mesma mulher, hospício, clínicas,
hospitais, muita dor, muito sofrimento, o coração e a alma sangrando demais.
Mas permaneci firme em meu propósito de deixar Jesus guiar minha vida.
E
nunca mais minha mãe chorou por minha causa.
Fiquei
64 dias internado numa clínica de recuperação. Descobri que sou portador de uma
doença chamada dependência química. Preciso de uma terapia, um dia de cada vez,
e acima de tudo da proteção de Deus. Aprendi através de Jesus e da Terapia dos
12 Passos que o uso abusivo de drogas não pode e não deve ser tratado com
violência, mas sim com compreensão e amor. Deus teve suas razões e não refez
meu casamento. Casei com Adriane, minha esposa diante de Deus e dos homens.
Hoje eu sei o que é ser feliz, olhar as pessoas de frente de igual para igual,
sentir o carinho enorme pelas minhas filhas, o amor por minha esposa, a alegria
de estar vivo, servir ao meu Jesus e até de ser pai outra vez, agora da Rachel
- uma menina linda que nasceu no dia 22 de agosto de 2000. E dentro de poucos
dias serei avô do Filipe, para minha felicidade. Tudo para honrar, louvar e
glorificar o Senhor Jesus!
Profissionalmente,
não tenho do que reclamar. Em 1998, participei de uma campanha eleitoral como
assessor de senador capixaba José Ignácio Ferreira. Hoje ele é o governador do
Espírito Santo e sou o seu porta-voz. Mas a minha grande felicidade é poder
dizer, de público e em qualquer momento, que, acima de tudo, eu sou é um
porta-voz de Jesus...
Que
o Senhor ilumine todos vocês.