CASAMENTO:
ENCANTAMENTO COM OBRIGAÇÕES E OBRIGAÇÕES COM
ENCANTAMENTO
Extraído
da Revista Ultimato, Editora Ultimato, Ano XXXVIII, no 294,
Maio/Junho 2005, www.ultimato.com.br
Pr.
José Antônio Corrêa
Podemos
ter três visões a respeito do casamento: a visão
demasiamente otimista, a visão demasiamente pessimista e a visão
prudentemente realista.
A
VISÃO DEMASIADAMENTE OTIMISTA
É a visão
romântica demais, de alguns anos atrás, presente nos enredos de certos
romances de amor e de certas novelas. As mulheres falam em
“príncipe encantado” e os homens, em “a mulher de meus
sonhos” ou “a mulher de minha vida”. As histórias de
amor dessa linha focalizam quase sempre apenas a fase de conquista e terminam
com a duvidosa e eufórica declaração: “E foram
felizes para sempre”. A esse respeito é oportuno transcrever um
parágrafo do artigo “Os casamentos de Charles e ‘jogos
subterrâneos’”, do conhecido psicanalista Contardo
Calligaris, publicado na Folha de São Paulo de 14 de abril:
Romances e filmes de
amor, em sua esmagadora maioria, narram as peripécias dos amantes
até que consigam se juntar. Depois disso, parece óbvio que eles
vivam “felizes para sempre”? Infeliz e frequentemente, nos
consultórios de psicoterapeutas e psicanalistas, a história dos
casais depois do cartão-postal inicial é contada em
versões bem menos sorridentes.
Está dentro
desse contexto a história do índio Peri e da
não-índia Ceci, no romance O Guarani, de José de Alencar,
escrito em 1857. E também a história dos adolescentes Romeu e
Julieta, que se apaixonaram num baile de máscaras em Verona e no dia
seguinte se casaram em segredo, já que suas famílias eram
inimigas entre si. A peça de William Shakespeare escrita em 1595 termina
em tragédia: primeiro Romeu comete suicídio na
suposição de que a amada esteja morta; depois Julieta, em face da
morte do amado, também se mata.
A desvantagem da visão
exageradamente otimista é que os nubentes são muito
ingênuos e se casam despreparados. Não admitem dificuldade
posterior alguma e não tomam medidas preventivas.
O abandono do
romantismo ou do otimismo exagerado talvez tenha ido longe demais. Colocamos na
mesma bacia as vantagens e as desvantagens e jogamos tudo fora.
A
VISÃO DEMASIADAMENTE PESSIMISTA
Hoje prevalece a visão
demasiadamente pessimista do casamento. Em vez de frases românticas,
colecionamos ditados e conceitos chocantes: “O amor é eterno
enquanto dura”; “Quando a pobreza bate à porta, o amor voa
pela janela”; “O amor faz passar o tempo e o tempo faz passar o
amor”.
E ouvimos conselhos absurdos:
“Se não fosse bobamente moralista, teria tido mais amantes e menos
maridos” (Elizabeth Taylor, atriz); “Hoje o que eu considerada
ideal seria poder ter duas, três, quatro mulheres, amigas, namoradas
eventuais, e elas terem dois, três, quatro homens” (José
Angelo Gaiarsa, psiquiatra); “Se a gente pensar bem, o casamento nunca
foi necessário” (Flávio Gikovate, psicoterapeuta).
Por essa razão, casa-se cada
vez menos e cada vez mais tarde. Ao mesmo tempo separa-se cada vez mais (de
81.130 divórcios e 76.200 separações judiciais em 1991
passamos para 129.520 divórcios e 99.690 separações em
2002). Metade dos casamentos na Inglaterra acaba antes de completar 18 meses.
Entre os americanos, o índice de divórcio é de 50%. Pela
mesma razão, o número de uniões consensuais tem aumentado
- das uniões celebradas no ano 2000 no Brasil, 70,5% foram
oficializadas, enquanto que 29,5% foram informais.
A
VISÃO PRUDENTEMENTE REALISTA
Do ponto de vista cristão, o
casamento é uma instituição natural, inaugurada por Deus
logo após a criação do homem e da mulher. Une duas pessoas
de sexos diferentes para viverem em companhia agradável uma da outra, até
que a morte ou a infidelidade contumaz e irreversível de um ou de ambos
os cônjuges os separe.
Mesmo fora do meio cristão,
considera-se que o casamento é bom para a saúde física e
mental e para a vida sexual. Pessoas casadas têm câncer e problemas
cardíacos mais raramente e vivem mais, de acordo com a revista alemã
Neus Leben, que se baseou em dados científicos. Entre os casados,
o número de suicídios é menor. Ser casado, conclui a
pesquisa, é um dos fatores que mais podem influenciar a felicidade
pessoal. E, ao contrário do que se afirma com frequência - que
nada é mais prejudicial à realização sexual do que
ser fiel a vida inteira, estudos demonstram que pessoas casadas fazem mais sexo
do que os solteiros e que a qualidade de vida sexual dos casados é
significativamente melhor.
A visão prudentemente realista
do casamento não é simplória como a visão
demasiadamente otimista e menos negativa do que a visão demasiadamente
pessimista.
Primeiro, a Palavra de Deus valoriza
tanto o casamento que em seu cânon há um livro que descreve o amor
apaixonado de um homem e uma donzela, que trocam entre si juras de amor e
elogios de beleza física e sensual. Trata-se do Cântico dos
Cânticos, o mais belo dos poemas da lavra de vida Salomão.
Segundo, logo no primeiro livro da
Bíblia, conta-se a história das três famílias da era
patriarcal (1900-
Portanto, que haja um
equilíbrio entre o sonho apaixonado do Cântico dos Cânticos
e a realidade do dia-a-dia do livro de Gênesis, um balanço entre
encantamento mútuo e obrigações mútuas.
É isso que nos leva e nos
prende à visão prudentemente realista do casamento. Tem
razão aquele que acrescentou à passagem do Cântico dos
Cânticos “o amor é tão forte como a morte” (Ct
8.6) estas palavras: “mas tem a fragilidade do vidro”!