A FINALIDADE DA CRUZ
Dave Hunt
Pr. José Antônio Corrêa
"Estou crucificado
com Cristo; logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim..."
(Gl 2.19b-20)
A
ilusão do "símbolo" do cristianismo
Os
elementos anticristãos do mundo secular dariam tudo para conseguir eliminar
manifestações públicas da cruz. Ainda assim, ela é vista no topo das torres de
dezenas de milhares de igrejas, nas procissões, sendo frequentemente feita de
ouro e até ornada com pedras preciosas. A cruz, entretanto, é exibida mais como
uma peça de bijuteria ao redor do pescoço ou pendurada numa orelha do que
qualquer outra coisa. É preciso perguntar através de que tipo estranho de
alquimia a rude cruz, manchada do sangue de Cristo, sobre a qual Ele sofreu e
morreu pelos nossos pecados se tornou tão limpa, tão glamourizada.
Não
importa como ela for exibida, seja até mesmo como joalheria ou como pichação, a
cruz é universalmente reconhecida como símbolo do cristianismo – e é aí que reside
o grave problema. A própria cruz, em lugar do que nela aconteceu há 19 séculos,
se tornou o centro da atenção, resultando em vários erros graves. O próprio
formato, embora concebido por pagãos cruéis para punir criminosos, tem se
tornado sacro e misteriosamente imbuído de propriedades mágicas, alimentando a
ilusão de que a própria exibição da cruz, de alguma forma, garante proteção
divina. Milhões, por superstição, levam uma cruz pendurada ao pescoço ou a tem
em suas casas, ou fazem "o sinal da cruz" para repelir o mal e
afugentar demônios. Os demônios temem a Cristo, não uma cruz; e qualquer um que
não foi crucificado juntamente com Ele, exibe a cruz em vão.
I. A "PALAVRA DA CRUZ": PODER DE DEUS
Paulo
afirmou que a "palavra da cruz é loucura para os que se perdem, mas para
nós, que somos salvos, poder de Deus", (1Co 1.18). Assim sendo, o poder da cruz não reside na sua exibição,
mas sim na sua pregação; e essa mensagem nada tem a ver com o formato peculiar
da cruz, e sim com a morte de Cristo sobre ela, como declara o evangelho. O
evangelho é "o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê"
(Rm 1.16), e não para aqueles que
usam ou exibem, ou até fazem o sinal da cruz.
O que é esse evangelho
que salva? Paulo afirma explicitamente:
"venho lembrar-vos o evangelho que vos anunciei... por ele também sois
salvos... que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, e que
foi sepultado, e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras" (1Co 15.1-4). Para muitos, choca o fato
do evangelho não incluir a menção de uma cruz. Por quê? Porque a cruz não era
essencial à nossa salvação. Cristo tinha que ser crucificado para cumprir a
profecia relacionada à forma de morte do Messias (Sl 22), não porque a cruz em si tinha alguma ligação com nossa
redenção. O imprescindível era o derramamento do sangue de Cristo em Sua morte
como prenunciado nos sacrifícios do Antigo Testamento, pois "sem
derramamento de sangue não há remissão" (Hb 9.22); "é o sangue que fará expiação em virtude da
vida" (Lv 17.11).
Não
dizemos isso para afirmar que a cruz em si é insignificante. O fato de Cristo
ter sido pregado numa cruz revela a horripilante intensidade da maldade inata
ao coração de cada ser humano. Ser pregado despido numa cruz e ser exibido
publicamente, morrer lentamente entre zombarias e escárnios, era a morte mais
torturantemente dolorosa e humilhante que poderia ser imaginada. E foi
exatamente isso que o insignificante ser humano fez ao seu Criador! Nós
precisamos cair com o rosto em terra, tomados de horror, em profundo
arrependimento, dominados pela vergonha, pois não foram somente a turba sedenta
de sangue e os soldados zombeteiros que O pregaram à cruz, mas sim nossos
pecados!
II. A CRUZ REVELA A MALIGNIDADE DO HOMEM E O AMOR DE DEUS
Assim
sendo, a cruz revela, pela eternidade adentro, a terrível verdade de que,
abaixo da bonita fachada de cultura e educação, o coração humano é
"enganoso... mais do que todas as coisas, e desesperadamente
corrupto" (Jr 17.9), capaz de
executar o mal muito além de nossa compreensão, até mesmo contra o Deus que o
criou e amou, e que pacientemente o supre. Será que alguém duvida da corrupção,
da maldade de seu próprio coração? Que tal pessoa olhe para a cruz e recue
dando uma reviravolta, a partir de seu ser mais interior! Não é à toa que o
humanista orgulhoso odeia a cruz!
Ao
mesmo tempo em que a cruz revela a malignidade do coração humano, entretanto,
ela revela a bondade, a misericórdia e o amor de Deus de uma maneira que
nenhuma outra coisa seria capaz. Em contraste com esse mal indescritível, com
esse ódio diabólico a Ele dirigido, o Senhor da glória, que poderia destruir a
terra e tudo o que nela há com uma simples palavra, permitiu-se ser zombado,
injuriado, açoitado e pregado àquela cruz! Cristo "a si mesmo se humilhou,
tornando-se obediente até à morte, e morte de cruz" (Fp 2.8). Enquanto o homem fazia o pior, Deus respondia com amor,
não apenas Se entregando a Seus carrascos, mas carregando nossos pecados e
recebendo o castigo que nós justamente merecíamos.
III. A CRUZ PROVA QUE EXISTE PERDÃO PARA O PIOR DOS PECADOS
Existe,
ainda, outro sério problema com o símbolo, e especialmente o crucifixo católico
que exibe um Cristo perpetuamente pendurado na cruz, assim como o faz a missa.
A ênfase está sobre o sofrimento físico de Cristo como se isso tivesse pagado
os nossos pecados. Pelo contrário, isso foi o que o homem fez a Ele e só podia
nos condenar a todos. Nossa redenção aconteceu através do fato de que Ele foi
ferido por Jeová e "sua alma [foi dada] como oferta pelo pecado" (Is 53.10); Deus fez "cair sobre
ele a iniquidade de nós todos" (Is
53.6); e "carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os
nossos pecados" (1Pe 2.24).
A
morte de Cristo é uma evidência irrefutável de que Deus precisa, em Sua justiça,
punir o pecado, que a penalidade precisa ser paga, caso contrário não pode
haver perdão. O fato de que o Filho de Deus teve que suportar a cruz, mesmo
depois de ter clamado a Seu Pai ao contemplar em agonia o carregar de nossos
pecados ["Se possível, passe de mim este cálice!" (Mt 26.39)], é prova de que não havia
outra forma de o ser humano ser redimido. Quando Cristo, o perfeito homem, sem
pecado e amado de Seu Pai, tomou nosso lugar, o juízo de Deus caiu sobre Ele em
toda sua fúria. Qual deve ser, então, o juízo sobre os que rejeitam a Cristo e
se recusam a receber o perdão oferecido por Ele! Precisamos preveni-los!
Ao
mesmo tempo e no mesmo fôlego que fazemos soar o alarme quanto ao julgamento
que está por vir, precisamos também proclamar as boas notícias de que a
redenção já foi providenciada e que o perdão de Deus é oferecido ao mais vil
dos pecadores. Nada mais perverso poderia ser concebido do que crucificar o
próprio Deus! E ainda assim, foi estando na cruz que Cristo, em seu infinito
amor e misericórdia, orou: "Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que
fazem" (Lc 23.34). Assim sendo,
a cruz também prova que existe perdão para o pior dos pecados, e para o pior
dos pecadores.
IV. CUIDADO: NÃO ANULE A CRUZ DE CRISTO!
A
grande maioria da humanidade, entretanto, tragicamente rejeita a Cristo. E é
aqui que enfrentamos outro perigo: é que em nosso sincero desejo de vermos
almas salvas, acabamos adaptando a mensagem da cruz para evitar ofender o
mundo. Paulo nos alertou para tomarmos cuidado no sentido de não pregar a cruz
"com sabedoria de palavra, para que se não anule a cruz de Cristo" (1Co 1.17). Muitos pensam: "É claro
que o evangelho pode ser apresentado de uma forma nova, mais atraente do que o
fizeram os pregadores de antigamente. Quem sabe, as técnicas modernas de
embalagem e vendas poderiam ser usadas para vestir a cruz numa música ou num
ritmo, ou numa apresentação atraente assim como o mundo comumente faz, de forma
a dar ao evangelho uma nova relevância ou, pelo menos, um sentido de familiaridade.
Quem sabe poder-se-ia lançar mão da psicologia, também, para que a abordagem
fosse mais positiva. Não confrontemos pecadores com seu pecado e com o lado
sombrio da condenação do juízo vindouro, mas expliquemos a eles que o
comportamento deles não é, na verdade, culpa deles tanto quanto é resultante
dos abusos dos quais eles têm sido vitimados. Não somos todos nós vítimas? E
Cristo não teria vindo para nos resgatar desse ato de sermos vitimados e de
nossa baixa perspectiva de nós mesmos e para restaurar nossa autoestima e
autoconfiança? Mescle a cruz com psicologia e o mundo abrirá um caminho para
nossas igrejas, enchendo-as de membros!" Assim é o neo-evangelicalismo de
nossos dias.
Ao
confrontar tal perversão, A. W. Tozer escreveu: "Se enxergo corretamente,
a cruz do evangelicalismo popular não é a mesma cruz que a do Novo Testamento.
É, sim, um ornamento novo e chamativo a ser pendurado no colo de um
cristianismo seguro de si e carnal... a velha cruz matou todos os homens; a
nova cruz os entretêm. A velha cruz condenou; a nova cruz diverte. A velha cruz
destruiu a confiança na carne; a nova cruz promove a confiança na carne... A
carne, sorridente e confiante, prega e canta a respeito da cruz; perante a cruz
ela se curva e para a cruz ela aponta através de um melodrama cuidadosamente
encenado – mas sobre a cruz ela não haverá de morrer, e teimosamente se recusa
a carregar a reprovação da cruz".
V. A CRUZ É O LUGAR ONDE NÓS MORREMOS EM CRISTO
Eis
o "x" da questão. O evangelho foi concebido para fazer com o eu
aquilo que a cruz fazia com aqueles que nela eram postos: matar completamente.
Essa é a boa notícia na qual Paulo exultava: "Estou crucificado com
Cristo". A cruz não é uma saída de incêndio pela qual escapamos do inferno
para o céu, mas é um lugar onde nós morremos em Cristo. É só então que podemos
experimentar "o poder da sua ressurreição" (Fp 3.10), pois apenas mortos podem ser ressuscitados. Que alegria
isso traz para aqueles que há tempo anelam escapar do mal de seus próprios
corações e vidas; e que fanatismo isso aparenta ser para aqueles que desejam se
apegar ao eu e que, portanto, pregam o evangelho que Tozer chamou de "nova
cruz".
Paulo
declarou que, em Cristo, o crente está crucificado para o mundo e o mundo para
ele (Gl 6.14). É linguagem bem
forte! Este mundo odiou e crucificou o Senhor a quem nós amamos – e, através
desse ato, crucificou a nós também. Nós assumimos uma posição com Cristo. Que o
mundo faça conosco o que fez com Ele, se assim quiser, mas fato é que jamais
nos associaremos ao mundo em suas concupiscências e ambições egoístas, em seus
padrões perversos, em sua determinação orgulhosa de construir uma utopia sem
Deus e em seu desprezo pela eternidade.
Crer
em Cristo pressupõe admitir que a morte que Ele suportou em nosso lugar era
exatamente o que merecíamos. Quando Cristo morreu, portanto, nós morremos nEle:
“... julgando nós isto: um morreu por todos, logo todos morreram. E ele morreu
por todos, para que os que vivem não vivam mais para si mesmos, mas para aquele
que por eles morreu e ressuscitou" (2Co
5.14-15).
"Mas
eu não estou morto", é a reação veemente. "O eu ainda está bem
vivo." Paulo também reconheceu isso: “... não faço o bem que prefiro, mas
o mal que não quero, esse faço" (Rm
7.19). Então, o que é que "estou crucificado com Cristo"
realmente significa na vida diária? Não significa que estamos automaticamente
"mortos para o pecado, mas vivos para Deus em Cristo Jesus" (Rm 6.11). Ainda possuímos uma vontade e
ainda temos escolhas a fazer.
VI. A CRUZ: O PODER SOBRE O PECADO
Então,
qual é o poder que o cristão tem sobre o pecado que o budista ou o bom
moralista não possui? Primeiramente, temos paz com Deus "pelo sangue da
sua cruz" (Cl 1.20). A
penalidade foi paga por completo; assim sendo, nós não tentamos mais viver uma
vida reta por causa do medo de, de outra sorte, sermos condenados, mas sim por
amor Àquele que nos salvou. "Nós amamos porque ele nos amou primeiro"
(1Jo 4.19); e o amor leva quem ama a
agradar o Amado, não importa o preço. "Se alguém me ama, guardará a minha
palavra" (Jo 14.23), disse o
nosso Senhor. Quanto mais contemplamos a cruz e meditamos acerca do preço que
nosso Senhor pagou por nossa redenção, mais haveremos de amá-lo; e quanto mais
O amarmos, mais desejaremos agradá-lo.
Em
segundo lugar, ao invés de "dar duro" para vencer o pecado, aceitamos
pela fé que morremos em Cristo. Homens mortos não podem ser tentados. Nossa fé
não está colocada em nossa capacidade de agirmos como pessoas crucificadas, mas
sim no fato de que Cristo foi crucificado de uma vez por todas, em pagamento
completo por nossos pecados.
Em
terceiro lugar, depois de declarar que estava "crucificado com
Cristo", Paulo acrescentou: "logo, já não sou eu quem vive, mas
Cristo vive em mim; e esse viver que agora tenho na carne, vivo pela fé no
Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim" (Gl 2.20). O justo "viverá por
fé" (Rm 1.17; Gl 3.11; Hb 10.38) em Cristo; mas o não crente só pode colocar sua fé em si mesmo
ou em algum programa de autoajuda, ou ainda num guru desses bem esquisitos.
VII. A MISSA: NEGAÇÃO DA SUFICIÊNCIA DA OBRA DE CRISTO NA CRUZ
Tristemente,
a fé católica não está posta na redenção realizada por Cristo de uma vez para
sempre na cruz, mas na missa, que, alegadamente, é o mesmo sacrifício como o
que foi feito na cruz, e confere perdão e nova vida cada vez que é repetida.
Reivindica-se que o sacerdote transforma a hóstia e o vinho no corpo literal e
no sangue literal de Cristo, fazendo com que o sacrifício de Cristo esteja
perpetuamente presente. Mas não há como trazer um evento passado ao presente.
Além do mais, se o evento passado cumpriu seu propósito, não há motivo para
querer perpetuá-lo no presente, mesmo que pudesse ser feito. Se um benfeitor,
por exemplo, paga ao credor uma dívida que alguém tem, a dívida sumiu para
sempre. Seria sem sentido falar-se em reapresentá-la ou reordená-la ou
perpetuar seu pagamento no presente. Poder-se-ia lembrar com gratidão que o
pagamento já foi feito, mas a reapresentação da dívida não teria valor ou
sentido uma vez que já não existe dívida a ser paga.
Quando
Cristo morreu, Ele exclamou em triunfo: "Está consumado" (Jo 19.30), usando uma expressão que, no
grego, significa que a dívida havia sido quitada totalmente. Entretanto, o novo
Catecismo da Igreja Católica diz: "Como sacrifício, a Eucaristia é
oferecida como reparação pelos pecados dos vivos e dos mortos, e para obter
benefícios espirituais e temporais de Deus" (parágrafo 1414, p. 356). Isso
equivale a continuar a pagar prestações de uma dívida que já foi plenamente
quitada. A missa é uma negação da suficiência do pagamento que Cristo fez pelo
pecado sobre a cruz! O católico vive na incerteza de quantas missas ainda serão
necessárias para fazê-lo chegar ao céu.
VIII. A CRUZ: SEGURANÇA PARA O PRESENTE E PARA TODA A ETERNIDADE
Muitos
protestantes vivem em incerteza semelhante, com medo de que tudo será perdido
se eles falharem em viver uma vida suficientemente boa, ou se perderem sua fé,
ou se voltarem as costas a Cristo. Existe uma finalidade abençoada da cruz que
nos livra dessa insegurança. Cristo jamais precisará ser novamente crucificado;
nem os que "foram crucificados com Cristo" ser
"descrucificados" e aí "recrucificados"! Paulo declarou:
"porque morrestes, e a vossa vida está oculta juntamente com Cristo, em
Deus" (Cl 3.3). Que segurança
para o presente e para toda a eternidade!