MENOS BATISTA, MENOS…
Pr. Isaltino Gomes Coelho Filho
Pr. José Antônio Corrêa
Estava em Monte Dourado, no vale do Rio Jari, aonde vou mensalmente para lecionar para um grupo de servos de Jesus e da sua igreja. Um privilégio dado por Deus, o de trabalhar na formação de obreiros. Vêm irmãos de Vitória do Jari, Laranjal do Jari e Munguba (do Amapá), Almeirim e Monte Dourado (do Pará). Estudo sério, um bom café, e sempre um bom peixe, no sábado.
Normalmente
hospedo-me na casa do Sales, irmão da igreja local. Desta última vez, um galo
tresloucado começou a cantar de madrugada, e às 10 da manhã ainda cantava. Que
fôlego (e que falta do que fazer!) do penoso galináceo! Sales disse que
foi presente de uma irmã da igreja para seu filho. E ela deu-lhe logo dois
galos! Citei-lhe um “provérbio” maldoso: “Quer se vingar de um inimigo? Dê uma
corneta para o filho dele!”. A irmã deve ter querido se vingar dele… Dois
galos! E, no ensejo, contei a história do galo que se julgava o mais poderoso
da fazenda onde morava. Mais poderoso que o boi, o cavalo e até mesmo que o
dono da fazenda. É que quando ele cantava, o sol nascia. Só ele conseguia fazer
isso. Nem o fazendeiro! O sol nascia porque ele cantava.
Uma noite, o
galo ficou na farra até altas horas, perdeu o tempo, e só acordou às nove. O
sol já ia alto. Consternado, ele descobriu que, cantasse ou não, o sol
nasceria. Ele não era tão importante assim. Até entrou em crise existencial.
Não era o que pensava…
Há gente como
este galo. Julga-se muito importante. Sem elas o mundo não iria bem, ou a
igreja afundaria. “Quero ver a igreja se virar sem mim!”, diz o crente vaidoso.
Ou “Se não fosse por mim, o reino de Deus não avançaria!”, pensa o obreiro com
complexo deste galo da história. Há famílias donas de igrejas (e como há!) que
pensam que sem elas a igreja morreria. São pessoas que têm um conceito mais
alto de si do que deveriam ter. Talvez a igreja melhorasse muito se elas
saíssem! Vez por outra, no Facebook (onde há coisas boas, mas medram
bobagens alimentadas pela falta de senso analítico, ausência cada vez mais
aguda no cenário evangélico) aparece um quadro com esta mensagem: “Você é
insubstituível!”. Aliás, título de um livro de autoajuda, da autoria de um
escritor famoso. Todas as vezes que vejo tal quadro me recordo de uma frase:
“Os cemitérios estão cheios de insubstituíveis!”. O mundo funcionava sem nós. E
depois que nos formos, o mundo ainda funcionará.
E também o
reino de Deus. Para cada Moisés Deus tem um Josué. Para cada Elias Deus tem um
Eliseu. Para um Judas que se vai, há um Matias que vem, e que até melhora o
ambiente. Deus é Soberano. Usa quem quer, quando quer, e não deve nada a
ninguém por isso. Usou a Assíria para disciplinar Israel, o Norte, e exclamou:
“Ai da Assíria, a vara da minha ira!” (Is 10.5). Usou a Assíria, mas esta não
ficou com crédito junto a ele. Ele a julgou. Nações e pessoas são instrumentos,
apenas. O sujeito das ações é ele. O autor da história é ele. A glória é dele.
O reino é dele, não nosso. A igreja é dele, não nossa. Só ele é insubstituível.
Aliás, ele é O INSUBSTITUÍVEL.
O serviço
cristão não é, como alguns dimensionam, algo a ser feito para ajudar a Deus nem
para salvar a igreja de uma hecatombe espiritual. Deus não precisa de
salvadores e a igreja é muito maior e muito mais poderosa do que pensamos. Ela
sobreviveu a pessoas melhores e a pessoas piores que nós. Ela sobreviveu à
perda de um Paulo e ao surgimento de um Nero. Ela é de Jesus e exatamente por
isso nunca será vencida.
O serviço
cristão é útil, sim, ao reino e à igreja. Isto é inegável. Mas se falharmos, o
reino e igreja continuam. Deus não fica desorientado porque perdeu um auxiliar
de ponta. Ele não é alguém patético, mas é o Senhor. “Socorro e livramento
virão de outra parte” (Ester 4.14). Ele terá outros para o serviço. Mas o
serviço é, também, para termos senso de utilidade. Para mostrarmos nossa
gratidão a Jesus (“O amor de Cristo nos constrange”- 2Co 5.14). Para nos
realizarmos como filhos de Deus. Quem serve com alegria é sempre abençoado. Não
vive buscando bênçãos. Sua bênção maior é servir. Quer glória maior que esta?
Sou pastor de
uma igreja que foi muito machucada. E como é uma igreja amorosa e sensível,
presumo que sua dor seja mais aguda do que se fosse uma igreja insensível em
relacionamentos. Sei que sou útil a ela. Sou obreiro numa região carente.
Mas não sou um herói. Nem um benemérito espiritual. Minha igreja me é mais útil
que eu para ela. Meu campo me é mais útil que eu para ele. Dão-me, igreja e
campo, oportunidade de me realizar como crente em Jesus (o pastor não deixa de
ser um crente em Jesus!). Posso fazer alguma coisa para meu Salvador. O serviço
cristão não é para nossa glória. É para nós glorificarmos a Deus. É uma
oportunidade para mostrarmos nosso amor a Jesus. Bem aventurado quem tem um
espaço para ser servo. A grande bênção da vida cristã é ser útil. Porque o
serviço cristão enriquece o servo. Dá uma dimensão enorme à sua vida. Servir
beneficia mais a quem serve que a Deus. Ele anda bem sem nós. Nós não andamos
bem sem ele. Nossa vida tem mais sentido quando somos instrumentos dele.
O galo que ficou na gandaia e perdeu a hora me lembra de um personagem de humor (humor fraco, mas humor) da televisão. Um personagem chamado Batista elogiava muito o chefe e este apenas dizia: “Menos Batista, menos…”. Pois, se alguém pensa de si mesmo que é o galo que faz o sol nascer, fica esta palavra: “Menos Batista, menos…”. Seja servo.