O ENSINO SOBRE O INFERNO

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Pr. José Antônio Corrêa

 

A palavra “inferno” vem do latim “inferii” e significa “lugar inferior”. A ideia de inferno como um lugar de fogo, para onde vão almas incorpóreas condenadas, não se encontra nas Escrituras, apesar de aplicações que normalmente se fazem de textos simbólicos e parábolas.

 

Esta palavra foi colocada nas traduções em português para substituir cinco outras palavras, com significado completamente diferente do conceito religioso popular do inferno. Isso ocorreu devido à crença que o tradutor nutria previamente, e que o influenciou a colocar a palavra “inferno” nas traduções que fez.

 

Algumas Bíblias antigas trazem “inferno” em 1Co 15.55, mas outras versões mais modernas, como a Almeida Atualizada, trazem “morte”, que é mais correto. O mesmo ocorre em Ap 20.13, onde se lia “a morte e o inferno”, encontra-se agora, “a morte e o além”. Nesta passagem, a palavra grega é hades, que pode significar “sepultura”.

 

AS CINCO PALAVRAS QUE FORAM NORMALMENTE TRADUZIDAS POR INFERNO SÃO:

 

GEENA (hebraico) que é uma forma simplificada da expressão ge (vale) bem (filho) e Hinom (nome da família proprietária de uma área próxima a Jerusalém), ou seja, “vale dos filhos de Hinom”. Essa palavra se encontra nos evangelhos (como em Mt 5.22, 29) e nada tem a ver com um inferno de fogo eterno. Era um vale onde se faziam sacrifícios humanos e se queimavam os corpos de pessoas aos ídolos. O profeta Jeremias profetizou que ali seriam lançados os corpos dos desobedientes, e lá ficariam expostos (Jr 7.31-34). Nos dias de Jesus, o local continuava a ser depósito de animais e lixo em putrefação, e os moradores sempre ateavam fogo para consumir os restos ali deixados. Esse lugar Jesus usou para simbolizar o fim trágico que aguarda os desobedientes. Apenas corpos físicos eram consumidos no GEENA, por isso que havia bichos nos corpos podres, coisa que “almas” não têm. Nada a ver com almas/espíritos queimando num fogo eterno.

 

HADES (grego) - usada no NT juntamente com SHEOL (hebraico – AT), e que significam “sepultura”, “lugar dos mortos”, “morada dos mortos”. Entre outros textos, hades aparece em Ap 20.13. Aqui o inferno (na verdade a sepultura) é o lugar onde estão os mortos, pois ele mesmo (inferno = sepultura) é lançado no lago de fogo, onde é destruído (Ap 20.14), pois a sepultura é o símbolo da morte que Jesus destruiu. Sheol, seu equivalente hebraico, também significa “sepultura”, sendo equivocadamente traduzida por “inferno”. Em Jó 17.16 declara-se que os mortos ficam no pó, e em Is 14.9-11 se declara que o inferno (sheol) é um lugar onde os bichos comem os cadáveres. Também nada a ver com lugar de fogo eterno. Aliás, ainda em Ap 20.10 se diz que o próprio Diabo somente será lançado no lago de fogo, que se forma quando Jesus volta no Juízo Final, quando Deus derrama fogo do céu. No verso 14 diz-se que o próprio inferno (sepultura) também é lançado nesse final lago de fogo. Posteriormente, explicaremos sobre o fogo ser “eterno”.

 

TANATO (grego). Esta palavra ocorre em vários lugares, mas é traduzida em 1Co 15.55 como “inferno”. Na realidade, a falha de tradução foi tão clara que nem os que creem no inferno tradicional mantiveram o erro, e corrigiram na Almeida Atualizada. Lá diz “onde está ó morte (tanato) a tua vitória onde está ó inferno (tanato = morte) o teu aguilhão?” O verso 54, diz que a morte (inferno) perde a vitória e o aguilhão, porque Jesus nos dá a imortalidade. Também não tem nada a ver com um lugar de fogo onde as pessoas ficam queimando.

 

TÁRTAROS (“lugar de trevas”). Esta palavra ocorre na Bíblia apenas uma vez em 2Pe 2.4. O próprio texto declara que os anjos foram expulsos da presença de Deus, ou seja, onde está a verdadeira luz, para o exterior que são as trevas, privados da luz do céu onde moravam. Conforme diz o texto, esse “inferno” também não tem fogo, somente a escuridão da ausência de Deus. Além do mais, em harmonia com Ap 20.9,10,14 eles estão aguardando o Juízo Final quando, somente então, serão lançados no Lago de Fogo produzido pelo fogo que desce do Céu e que os destrói juntamente com os que rejeitaram a salvação de Cristo. Esta palavra, a última, também nada tem a ver com o inferno tradicional.

 

Surge então a pergunta: e o “fogo eterno” que Ap 20 diz que se formará depois do milênio, com o fogo e enxofre que desce do céu?

 

O FOGO ETERNO NA BÍBLIA

 

As passagens onde aparece a menção do fogo eterno são as seguintes:

 

Mt 18.8

Mt 3.12

Ap 14.11

Mt 25.41

Mc 9.43

Ap 19.3

Jd 1.7

Lc 3.17

Ac 20.10

 

A palavra grega para “eterno”, ou equivalente, é aion, que significa uma duração relativa ao que se refere. Pode estar falando que é eterno “sem fim”, ou que é eterno “enquanto dura”. Ou seja, precisamos examinar o contexto para saber se é eterno sem fim, ou eterno até que acabe.

 

Em Ap 20.10 diz-se que serão atormentados pelos séculos dos séculos (aion ton aion, em grego, que quer dizer “para sempre”, “eternamente”, conforme algumas traduções). Mas esse “pelos séculos dos séculos” é previamente explicado no verso anterior, que diz que o fogo que desceu do céu os “CONSUMIU” (do grego KATAPHAGEN, a  mesma palavra que Jesus utiliza na parábola do semeador para dizer que as aves COMERAM as sementes que estavam à beira do caminho – cf. Mt 13.4); logo, serão atormentados “eternamente” até que toda a substância seja consumida, tendo como resultado, a destruição - que será “eterna”.

 

Outro exemplo que nos ajuda a entender este “fogo eterno” é o texto de Jd 6.7, onde diz de forma clara que os anjos estão em trevas esperando o Juízo (o mesmo que diz Pedro, como já vimos) em “algemas ETERNAS” (aion). Ora, as algemas eternas serão tiradas quando chegar o Juízo e a condenação final, e a sentença for decretada, assim, a algema é “eterna” somente até que se cumpra o seu objetivo.

 

O verso 7 diz que o “exemplo do fogo eterno” é o da punição que caiu sobre Sodoma e Gomorra e as cidades vizinhas. Qual foi a punição de Sodoma e Gomorra? Estão queimando até hoje? Claro que não!

 

O apóstolo Pedro declara que Sodoma e Gomorra se tornaram em “cinzas” (2Pe 2.6) para mostrar o exemplo do que acontecerá aos que vivem impiamente.

 

Deus é amor (1Jo 4.8). Como podemos crer que Ele deixaria alguém ficar por milênios, pela eternidade afora, sendo queimado em dores inimagináveis por pecados de uma vida passageira?

 

Deus NUNCA falou isso; mas disse que o homem que pecasse, morreria (Ez 18.20); a consequência de comer da árvore da Ciência do Bem e do Mal era a morte (Gn 2.17).

 

Quem lançou o ensino da imortalidade não foi Deus, mas sim o diabo (Gn 3.4).

 

A PARÁBOLA DO RICO E LÁZARO (Lc 16.19-31)

 

O próprio relato já é considerado uma “parábola”. Nela, o justo não vai para o céu, mas para o simbólico “seio de Abraão”; também não se trata de “almas” (no conceito moderno espírita) no fogo, mas de corpo físico com dedo, língua e que sente calor e pede água para matar a sede.

 

O rico teve muitas oportunidades para socorrer a Lázaro, mas não o fez. Evidentemente não tratou mal ao desventurado que, sem dúvida o supunha o rico, estava sofrendo um castigo de Deus. Sua atitude foi similar a que expressou Caim quando respondeu: "Sou eu guardador do meu irmão?" (Gn 4.9). Não maltratou a Lázaro, mas não foi misericordioso com ele. Adotou uma posição negativa frente a suas responsabilidades nesta vida, em vez de assumir uma atitude positiva. Não conhecia o verdadeiro significado do segundo grande mandamento da lei, que ordena amar ao próximo (ver com Mt 5.43; 22.39; 25.35-44). Este rico, como a nação judia, não estava fazendo nenhum bem positivo, e por isso era culpado de um grave mal: apropriava-se de todas as vantagens que o céu lhe tinha concedido, desfrutando delas apenas para seu próprio prazer e complacência. Essa era a lição que Jesus queria ensinar com a parábola, conforme o próprio contexto da passagem nos esclarece. Não tinha nada que ver com o destino dos mortos, mas sim com a falta de compaixão que a nação judaica nutria pelos então considerados “ímpios”.

 

SURGIMENTO DA DOUTRINA DO INFERNO

 

É clara a intenção dos teólogos de concretizar na mente das pessoas a ideia de um inferno literal, como destino para aqueles que morressem desligados da salvação. Segundo Paul Johnson, em seu livro História do Cristianismo, “os escritores pastorais eram muito mais específicos a respeito do Inferno que do Céu; escreviam como se tivessem estado lá. Os três grandes doutrinadores medievais – Agostinho, Pedro Lombardo e Aquino – insistiam em que as penas infernais eram tanto físicas quanto mentais e espirituais, e fogo de verdade tomava parte dos tormentos” (2001, pág. 413).

 

A mitologia grega foi a grande influência sobre o cristianismo, com relação ao tema do inferno. Os gregos faziam uso constante da figura do Hades (o local onde eles acreditavam que a alma dos mortos permanecia ardendo em fogo eterno), o que foi posteriormente introduzido e desenvolvido na teologia católica e cristã como um todo.

 

A História Cristã demonstra que a doutrina do inferno desenvolveu-se paulatinamente, desde o início do catolicismo romano, e foi cada vez ganhando mais força e adeptos ao longo da Idade Média, chegando até os dias atuais.

 

CONCLUSÃO

 

Finalmente, o apóstolo Paulo ensina que mesmo os que morreram em Cristo não estão ainda habitando o céu, a não ser quando ocorrer a ressurreição. Eles não vão nem para o céu, nem para um lugar de tormento ao morrerem. Isso somente ocorrerá com a final destruição dos ímpios na volta de Jesus. Também não vão como almas sem corpo. A Bíblia ensina que se não houver ressurreição “naquele dia”, todos os que morreram em Cristo, mesmo eles, estarão perdidos (1Co 15.16-18).

 

É interessante notar como a doutrina da ressurreição dos mortos é pouco falada nos púlpitos que ensinam a vida após a morte, pois seria uma grande contradição tentar conciliar estes dois ensinos – ressurreição x recompensa logo após a morte. Imagine o caso de Lázaro: ser ressuscitado (ou retirado da "Glória" como ensinam alguns cristãos de hoje) e devolvido para a miséria deste nosso mundo doente!

 

Em Ez 18.23 Deus declara que não tem prazer na MORTE do ímpio, não se compraz em seu tormento eterno. Perder a salvação, sofrer “conforme as suas obras” e receber a morte e o esquecimento eterno é a maior punição que Deus pode dar a alguém. É um verdadeiro sadismo se deleitar na dor prolongada de alguém. Deus não faz isso, nem mesmo no ato da morte, quanto mais na contemplação eterna de alguém em infinitas agonias.

 

Graças a Deus que sua Palavra nos informa: “não tenho prazer na morte de ninguém” (Ez 18.32; 33.11), mesmo que seja ímpio. A extinção é a pena máxima.

 

Louvado seja o Senhor pelo Seu infinito amor pelo ser humano!