UNÇÃO COM ÓLEO: OUTRA VISÃO

Pr. Isaltino Comes Coelho Filho

 

Pr. José Antônio Corrêa

 

O Jornal Batista publicou artigo do honrado pastor Tarcísio, da PIB de Divinópolis, sob o tema acima. Ele é um dos obreiros de mais futuro em nossa denominação. Preguei em sua ex-igreja, quando ele era pastor em Feira de Santana, BA. Em seu ministério atual, fiz duas séries de pregações. Vi sua firmeza pastoral. Um senhor obreiro!

 

Em 1986, a JUERP lançou meu livro "Tiago, nosso contemporâneo". Teve três edições em português e uma em espanhol, em Cuba, de confecção artesanal, distribuída a pastores e seminaristas. Agora, aprofundei-me nos estudos e refiz o livro, como parte do Comentário Bíblico King James, da Abba Press, do qual sou o redator. Será outra edição, mais volumosa.

 

Naquela obra subscrevi a posição do pastor Tarcísio, mas mudei minha visão. E a exponho, mesmo sabendo que virão críticas. Mas um dos votos que fiz a Deus foi que não hesitaria em mudar de posição quando convencido. Outro foi de que não esconderia minha posição.

 

O artigo foca Tiago 5.14. Neste texto, a Bíblia Vozes comenta: "Conforme o Concílio de Trento, o sacramento da Unção dos Enfermos se identifica com a prática aqui descrita". A Bíblia de Jerusa­lém diz que "a Igreja viu uma forma inicial do sacramento da Unção dos Enfermos". É normal que Roma queira basear aqui o sacramento da Extrema Unção. Não encontrará outro texto, no NT, mais próximo da prática. Mas a doutrina surgiu no século XII, e Tiago não fala de morte, e sim de cura do doente. A King James refuta a ideia: "Diferentemente do que afirmam alguns teólogos, essa não é uma indicação para a prática da 'extrema unção'”. Primeiro, porque Tiago está se referindo aos presbíteros e não aos sacerdotes; segundo, porque o uso do verbo grego original sozo, cujo significado é, ao mesmo tempo, 'salvar' e 'curar', indica uma oração para a vida e não preparativo para a morte. Tiago é claro: ”e a oração, feita com fé, curará o doente, e o Senhor o levantará".

 

Eis o ponto: “Chame os presbíteros da igreja, a fim de que estes orem sobre a pessoa enferma, ungindo-a com óleo em o Nome do Senhor; e a oração, feita com fé, curará o doente, e o Senhor o levantará”. O doente deve chamar os presbíteros para que orem sobre ele e o unjam em nome do Senhor. A oração, não o óleo, curará o doente. É a oração que cura, mas Tiago diz para ungir o doente com óleo.

 

A CBB não tem o hábito de ungir enfermos com óleo. Eu nunca o fiz. Mas não posso dizer que fazê-lo seja desvio doutrinário. Se os batistas não aprovamos não é pertinente. O pertinente é isto: o que Tiago disse, exatamente? Disse para ungir o enfermo com óleo e orar sobre ele.

 

O pastor Tarcísio cita um articulista: "Existem dois verbos gregos com o sentido de esfregar, ou ungir. O primeiro é chrio, que significa ungir num ritual. Não foi esse o termo que Tiago usou. O verbo em Tiago 5.14 é aleipho, cujo significado é esfregar com óleo. Assim sendo, Tiago não estava referindo-se a um ritual. Pelo contrário, ele falava de uma atitude refrescante e estimulante para com as pessoas doentes ou deprimidas”. Mas a distinção entre chrio e aleipho não é correta. Assim, a afirmação de que Tiago falava de atitude refrescante e estimulante também não é.

 

Diz Marcos 6.13: "E expulsavam muitos demônios; ungiam com óleo a inúmeros doentes e os curavam”. O verbo aleipho é usado aqui, em "ungiam”, e não é em "atitude refrescante e estimulante". Associam-se novamente doença, oração e cura. Respeitando o colega, a afirmação de que Tiago está dizendo algo como: “Está alguém entre vós doente? Chame os pastores da igreja, e orem sobre ele, pedindo que o Senhor abençoe a sua quimioterapia, o seu analgésico, o seu antibiótico, a sua vacina, os seus remédios” não é correta nem feliz. Tiago não diz que os pastores devem pedir para que o óleo cure o doente (o articulista vê o óleo como remédio). Diz: ”e a oração, feita com fé, curará o doente". O poder curador está na oração, segundo Tiago, e não no óleo. Deus responde orações e cura pessoas. Com ou sem remédio. Com ou sem óleo. O óleo não cura, não é remédio, mas pode ser usado. Como diz para orar pelos enfermos, ele diz para ungi-los com óleo. E óleo (élaio) é óleo, não remédio. Não podemos impor nossos pressupostos doutrinários ao texto.

 

Outro respeitável articulista escreve: ”Dicionaristas indicam que aleipho era a palavra secular para ungir e que crio (sic) era a palavra sagrada para ungir com finalidade de consagração". Sobre isto, cito o Dr. Taylor: "É inexato dizer que aleipho é 'vocábulo profano' e chrio 'palavra sacra' (...) Chrio se encontra nos papiros no sentido de untar um cavalo, e aleifo mesmo no NT, não tem sentido profano” (Mc 6.13; 16.1; Lc 7.38, 46; Jo 11.2 e 12.3).

 

Brunotte comenta sobre isso: "Ungir é um ato simbólico através do qual os demônios são expulsos. As curas levadas a efeito pelos discípulos ou pelos presbíteros da igreja foram acompanhadas pela unção, ocorrendo no contexto da pregação e da oração. A cura, e, portanto, a unção também, veio a ser vista como um sinal visível do começo do reino de Deus. Qualquer entendimento semi-mágico da unção, no entanto, é firmemente refreado em Tg 5.13 e seguintes, pela importância atribuída à oração que a acompanha”.

 

Martorelli Dantas diz que é o racionalismo na igreja que vê a unção com óleo como sem valor e a nega, e afirma: "A unção, nos moldes de Tiago 5.14, é um ato de obediência àquilo que foi prescrito pela Palavra inspirada de Deus; em segundo lugar, nós cremos que Deus continua a curar enfermos em atenção à oração da igreja, de acordo com sua soberana vontade. Isto nunca deixou de ser assim, e o será, cremos nós, até a volta gloriosa de Cristo”

 

Aceito sua posição: o que foi prescrito na Palavra de Deus deve ser acatado. A questão não é se aceitamos ou não ungir com óleo. A questão é que a Bíblia diz que o doente pode ser ungido com óleo. O óleo não é mágico e não cura. Deus cura, em resposta à oração. Mas ungir com óleo não é heresia. A prática está no NT. E cinco questões me ficam claras, neste aspecto (sigo e adapto MartoreIli):

 

1. A unção com óleo deve ser feita apenas por oficiais constituídos pela igreja.

 

2. A unção do enfermo com óleo não é ordenança; não foi ordenada por Jesus.

 

3. O lugar adequado para ministrar o óleo é onde o enfermo está. Não há indicação de prática em culto público.

 

4. O óleo não tem poder de curar, e sim Deus, em resposta à oração em nome de jesus.

 

5. Não se diz onde passar o óleo, mas desde o inicio do cristianismo era na testa do enfermo.

 

Não há a ideia de poder espiritual do óleo. Nem se recomenda seu uso em culto público. Ele faz parte de um simbolismo que pode nos escapar, mas seu uso é neotestamentário. Exegeticamente, não se pode dizer que ungir um doente e orar por ele seja desvio doutrinário. Podemos não gostar, mas Tiago recomenda. E repito: a questão não é se é nossa prática ou não, mas se a Bíblia diz. A palavra de Tiago é clara e não se lhe pode dar outro sentido.

 

Respeitando os demais: Tiago diz para ungir com óleo e orar. O óleo é óleo, e não remédio. São coisas diferentes: ungir com óleo e orar. A oração cura, não o óleo. Mas a unção com óleo está claramente dita na Bíblia. Sem querer diminuir alguém e provocar debates, é como vejo. "E eu penso que também tenho o Espírito de Deus” (2Co 7.40).